Os erros associados ao método de amostragem em ecologia de estradas
Para quantificar a mortalidade de fauna em uma rodovia é importante considerar e mensurar os erros da metodologia de amostragem (MacKenzie & Kendall, 2002). Vários estudos assumem que diferenças entre rodovias ou trechos são decorrentes de diferenças entre as áreas de estudo, quando na verdade podem ser devido à detecção ou remoção de carcaças (Slater, 2002).
As estimativas de mortalidade são afetadas por dois fatores principais: a persistência das carcaças dos animais atropelados na rodovia e a detectabilidade das carcaças pelo observador em campo (Prosser et al., 2008). O tempo de persistência é a probabilidade da carcaça ainda estar disponível para detecção na rodovia durante as campanhas de campo, e pode ser influenciada pelo clima, abundância e diversidade de carniceiros, tráfego de veículos e tamanho da carcaça (Morrison, 2002).
Já a detectabilidade da carcaça consiste na probabilidade da carcaça ser encontrada pelo observador e pode ser afetada por inúmeros fatores como: a metodologia utilizada na amostragem (carro, a pé ou bicicleta, por exemplo), a eficiência do pesquisador de campo em encontrar um animal atropelado, o tamanho, a cor e a idade da carcaça (Slater, 2002). As amostragens realizadas a pé apresentam maior probabilidade detecção do que os experimentos conduzidos por automóveis, sendo que o estudo com veículo se torna interessante quando se trata de um trecho de muitos quilômetros a ser monitorado (Slater, 2002).
O método utilizado para corrigir o erro amostral
Para maiores detalhes do método utilizado para avaliação da remoção das carcaças, da detectabilidade das carcaças e analise dos dados clique no link abaixo.
Método de avaliação da remoção e detectabilidade das carcaças
Resultados – Tempo de Persistência das Carcaças
Durante o período do estudo, foram registrados e acompanhados 532 animais (2% anfíbios, 19% répteis, 71% aves e 8% mamíferos). Do total, 381 animais possuíam peso <100g e 151 possuíam peso > 100g. Foram encontrados apenas 14 anfíbios, que foram excluídos das analises.
Considerando todos os animais a média de persistência das carcaças foi de 2,2 dias na rodovia, com probabilidade de 57% de ser removido da estrada após 24 horas, 70% de chance de ser removido após 48 horas e 93% de chance de remoção após 96 horas. Os valores indicam uma baixa probabilidade de persistência global, com uma remoção substancial dos animais atropelados no primeiro dia.
O tempo médio de persistência de uma carcaça de réptil na rodovia foi de 2,35 dias. Após 24h, há uma chance de 49% de uma carcaça de um réptil ser removida, aumentando para 64% de chance após 48h e 91% de chance após 96h. O grupo das aves foi o que apresentou menor probabilidade de persistência das carcaças, com média de tempo de persistência de 1.93 dias na rodovia. A probabilidade de uma carcaça de uma ave ser removida da estrada após 24h foi de 61%, após 48h a carcaça tem 74% de chance de ser removida e após 96h apresenta 95% de chance. O grupo dos mamíferos foi o que apresentou maior probabilidade de permanecer na pista, com média de tempo de persistência de 4,35 dias, e 35% de chance de ser removido após 24h, 42% de chance de ser removidos após 48h e 69% de chance após 96h. Considerando o intervalo de confiança, só houve diferença significativa no tempo de permanência entre mamíferos e aves.
Resultados da estimativa de persistência para os dados globais e classe. N: tamanho da amostra; Média: probabilidade de persistência média em dias; T=1, T=2, T=3, T=4 (95% IC): probabilidade de persistência (ou de encontrar uma carcaça) estimada pelo Kaplan-Meier para 1 dia (T=1), 2 dias (T=2), 3 dias (T=3) e 4 dias (T=4) com intervalo de confiança de 95%.
Grupo Taxonômico |
N |
Média (dias) |
T=1 |
T=2 |
T=3 |
T=4 |
Répteis |
101 |
2.35 |
0.51 (0.42-0.62) |
0.36 (0.28-0.47) |
0.18 (0.12-0.27) |
0.09 (0.05-0.17) |
Aves |
372 |
1.93 |
0.39 (0.34-0.44) |
0.26 (0.22-0.31) |
0.12 (0.09-0.16) |
0.05 (0.03-0.07) |
Mamífero |
42 |
4.23 |
0.65 (0.52-0.81) |
0.58 (0.45-0.75) |
0.42 (0.30-0.60) |
0.31 (0.19-0.48) |
Todos os Grupos |
515 |
2.15 |
0.43 (0.39-0.48) |
0.30 (0.27-0.35) |
0.16 (0.13-0.19) |
0.07 (0.05-0.10) |
Para as carcaças com peso < 100g o tempo médio de persistência na rodovia foi de 1,8 dias. A chance de uma carcaça com esse peso ser removida da rodovia após 24h foi de 64%, e após 96h a chance foi de 97%. Já para os animais com peso > 100g o tempo médio de persistência da carcaça na rodovia foi de 4,14 dias. Após 24h a chance de uma carcaça com peso > 100g ser removida foi de 29%, e após 96h foi de 73%. Considerando o intervalo de confiança, os resultados mostram que houve diferença significativa no tempo de permanência entre as duas classes de peso.
Resultados da estimativa de persistência para os dados por peso. N: tamanho da amostra; Média: probabilidade de persistência média em dias; T=1, T=2, T=3, T=4 (95% IC): probabilidade de persistência (ou de encontrar uma carcaça) estimada pelo Kaplan-Meier para 1 dia (T=1), 2 dias (T=2), 3 dias (T=3) e 4 dias (T=4) com intervalo de confiança de 95%.
Groups | N | Média (dias) | T=1 | T=2 | T=3 | T=4 |
WVC < 100g* |
316 | 1.80 | 0.36 (0.32-0.41) | 0.24 (0.20-0.29) | 0.09(0.07-0.13) | 0.03(0.02-0.05) |
WVC >100g** |
199 | 4.14 | 0.71 (0.65-0.78) | 0.57 (0.51-0.64) | 0.42 (0.36-0.50) | 0.27 (0.22-0.34) |
Resultados – Detectabilidade do Observador
Durante o período do teste de detectabilidade, a equipe que realizou o monitoramento a pé registrou 177 animais atropelados, dos quais 16% eram anfíbios, 28% répteis, 42 aves e 14% mamíferos. Desse total encontrado pela equipe a pé, apenas 10 carcaças (2 répteis, 6 aves e 2 mamíferos) foram encontradas pela equipe de carro, o que corresponde a uma eficiência na detecção de carcaças de 10% pelo monitoramento realizado por veículos. A eficiência na detecção por classe foi: 7,6% (intervalo de confiança:1-26%) para répteis, 12,2% (5-23%) para aves e 12,5 (3-37%) para mamíferos. Já quando observamos os resultados por peso, a eficiência na detecção da equipe de carro foi: 7% (2-15%) para os animais com peso < 100g e 13,3% (4-29%)
Resultados – Estimativa de Mortalidade
Com os dados de persistência das carcaças e da eficiência do observador ao procurar as carcaças no carro é possível estimar o quanto se perde pelo método de amostragem. Dessa maneira podemos ter uma idéia aproximada de quantos animais realmente morrem nas estradas.
Com base dos resultados obtidos (incluindo o efeito da remoção e da detecção) estima-se que 0,83 animais morrem por quilometro e por dia apenas nos trechos do Rodofauna. Quando multiplicamos esse valor pelo total de quilômetros percorridos pelo projeto (114 quilômetros) obtemos o valor de 94 animais mortos por dia. Esse valor é ainda mais surpreendente quanto extrapolamos para o período de 1 ano.
34.310 animais morrem anualmente apenas em 114 km
Desse total estima-se que 71% sejam aves, 20% répteis e 9% mamíferos. Quando extrapolamos esse valor para as rodovias, com características similares ao trecho monitorado pelo Rodofauna no Distrito Federal (350 quilômetros aproximadamente), estima-se que 106.032 animais morram anualmente no Distrito Federal.
Estimativa de mortalidade corrigida pela detectabilidade e remoção das carcaças. Detectabilidade: eficiência do observador na detecção de carcaças no veiculo; N/km/dia: número de atropelamentos por dia e por quilometro. Intervalo de confiança nos parênteses.
Grupo |
Detectabilidade |
Tempo Persistência Média (dias) |
Mortalidade Sem correção N/km/dia |
Estimativa de Mortalidade Corrigida N/km/dia
|
Reptiles |
7.6 (1-26) |
2.35 |
0.02 |
0.21 (0.06-2.43) |
Birds |
12.2 (5-23) |
1.93 |
0.11 |
0.70 (0.35-1.74) |
Mammals |
12.5 (3-37) |
4.23 |
0.01 |
0.03 (0.009-0.24) |
Carcaça < 100g |
6.8 (2-15) |
1.80 |
0.13 |
1.32 (0.62-3.94) |
Carcaça> 100g |
13.3 (4-29) |
4.14 |
0.06 |
0.12 (0.06-0.41) |
Todos os grupos |
10 (6-19) |
2.15 |
0.15 |
0.83 (0.47-1.17) |
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