Governo do Distrito Federal
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13/05/21 às 22h21 - Atualizado em 1/02/24 às 10h19

As Capivaras e a Febre Maculosa Brasileira (FMB) – A realidade do Distrito Federal

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Estudos recentes sugerem que não há a presença  das bactérias riquétsias responsáveis pela febre maculosa brasileira no Distrito Federal. Apesar dessa constatação, os órgãos ambientais e de saúde em parceria com o Ministério da Saúde trabalham em conjunto buscando dar continuidade ao estudo das populações de vertebrados e carrapatos não somente na região da orla do lago Paranoá, como também em outros locais, para manter a população informada a protegida de qualquer possível mudança no panorama atual.

 

Para informações entre em contato pelo Whatsapp número (61) 99187-3064

 

Febre Maculosa Brasileira 

A capivara é um dos hospedeiros do carrapato-estrela (Amblyomma sculptum), o qual transmite a  bactéria da Febre Maculosa Brasileira (FMB). Esse carrapato funciona como vetor e reservatório da bactéria Rickettsia rickettsii, microrganismo responsável pela FMB. O carrapato pode ser encontrado em cavalos e outros animais de grande porte, cães, aves domésticas, roedores.

 

Ciclo biológico de Amblyomma sculptum

A. sculptum é uma espécie de carrapato que possui ciclo de vida trioxeno, ou seja, três hospedeiros são necessários para completar o seu ciclo de vida, que se inicia com as fêmeas bem alimentadas (ingurgitadas), também chamadas de teleóginas, que se desprendem do animal e caem no solo nos períodos frescos do dia, como no inicio da manha, final da tarde ou inicio da noite. No solo, as teleóginas procuram um local protegido, entre a vegetação e o solo, para ficarem até o término da postura. Com o fim da postura, elas morrem e deixam os ovos, os quais vão iniciar uma nova fase do ciclo de vida desse carrapato.

 

Visto isso, em condições favoráveis, ocorre a eclosão de larvas dos ovos, que após atingirem a maturação, formam os “bolinhos de larva” (figura 1), aglomerados de larvas nas pontas de folhas de plantas baixas ou de capins, até que apareça algum potencial hospedeiro, como capivaras e cavalos (hábito de espreita ou tocaia). Após fixação no hospedeiro, as larvas realizam o processo chamado de “ingurgitamento”, no qual ocorre o repasto sanguíneo. Posterior a essa fase, elas se desprendem novamente e voltam ao solo para a realização da ecdise (troca de muda) e surgimento das ninfas.

 

As ninfas também podem formar aglomerados nas pontas das folhas, assim com larvas, ou realizam uma busca ativa por hospedeiros, percorrendo curtas distancias. Quando em contato com o hospedeiro, ocorre o repasto sanguíneo e as ninfas se desprendem do animal e, no solo, realizam a segunda ecdise, tornando-se, assim, adultas. Os adultos, com as mesmas técnicas de busca por hospedeiro, se fixam em um animal, se alimentam e copulam. Em seguida, fêmeas ingurgitadas se soltam do animal, enquanto os machos ficam por mais tempo à espera de outras fêmeas (figura 2).

 

Figura 1 – Larvas de Amblyomma spp. na folha, ou “bolinhos de larvas”.

Fonte: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

 

 

Figura 2 – Ciclo biológico de Amblyomma sculptum.

Fonte: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento    

 

Ciclo de transmissão da febre maculosa e seus sintomas

A disponibilidade de carrapatos infectados no ambiente advém do ciclo da bactéria que ocorre entre os animais e vetor. Durante a primeira infecção, após a picada por carrapatos infectados pela bactéria Rickettsia rickettsii, as capivaras atuam como amplificadoras da bactéria. Por aproximadamente 15 dias, as riquétsias podem estar presentes na corrente sanguínea (bacteremia) tendo potencial, portanto, de infectar novos carrapatos e intensificar o risco de transmissão para outros animais e o ser humano. Após esse período, a capivara não é mais fonte de infecção. Com o sistema imune já sensibilizado, os anticorpos disponíveis combaterão futuras infecções pela bactéria relacionada a FMB, impedindo a sua amplificação (Figura 3).  Filhotes de capivaras e outros animais que nunca tiveram contato com a bactéria, quando em áreas que possuem a circulação da Rickettsia rickettsii, possuem maiores riscos de contaminação.

 

Para transmitir as riquétsias, o carrapato-estrela infectado precisa ficar ao menos quatro horas fixado na pessoa. Os carrapatos mais jovens (micuins) e de menor tamanho são vetores mais eficazes, pois são mais difíceis de serem detectados.

 

Figura 3 – Ciclo da Febre Maculosa Brasileira (FMB) em capivaras. Fonte: Semil/SP.

 

A doença causada pela bactéria Rickettsia rickettsii, não presente no Distrito Federal, inicia-se com sintomas semelhantes aos de outras infecções, como febre alta, dor no corpo, dor de cabeça e desânimo. A  enfermidade apresenta considerável letalidade (próximo aos 33%, podendo chegar até 80%, como já ocorreu no estado de São Paulo) se não tratada precocemente (Figura 4). Por isso, a importância de verificar se antes de apresentar os sintomas a pessoa esteve em alguma localidade de ocorrência natural para febre maculosa brasileira. Essa informação pode ser o limiar entre o sucesso ou o fracasso na tomada de decisão acerca do tratamento da enfermidade.

 

A FMB é uma doença de notificação obrigatória e todo caso classificado como suspeito deve ser notificado às autoridades locais de saúde, que irão realizar a investigação epidemiológica e avaliar a necessidade de adoção de medidas de controle.

 

Figura 4. Evolução nos 10 primeiros dias dos sinais e sintomas mais comuns da febre maculosa brasileira causada por Rickettsia ricketsii.

 

O período de incubação da doença dura sete dias, em média, podendo variar de dois a 14 dias, ou seja, quando um carrapato infectado por riquétsia pica a pele do hospedeiro humano, o indivíduo permanece assintomático por cerca de uma semana, em média. Somente após esse período, a doença manifesta os sintomas, muitas vezes de forma abrupta.

 

Febre maculosa no Brasil e no Distrito Federal

Conforme a Secretaria de Vigilância em Saúde (Ministério da Saúde), a partir de 2001, os casos de FM começaram a ser confirmados no Sudeste do país. No entanto, de 2003 em diante, observa-se que a Febre Maculosa se expande para todas as regiões do território nacional, sendo as Regiões Sudeste e Sul as responsáveis por mais de 80% dos casos (figura 5).

 

Figura 5. Distribuição geográfica dos casos confirmados de febre maculosa segundo unidade Federada. Brasil, 2001 a 2021

 

As informações publicadas no Boletim Epidemiológico pelo Ministério da Saúde foram baseadas nos bancos de dados a partir de 2007, ano em que foi elaborada a ficha de notificação e investigação para a doença, sendo inserida no SINAN – Sistema de Informação de Agravos de Notificação.  De 2007 a 2021 foram notificados 36.497 casos de febre maculosa no Brasil, dos quais 7% (N = 2.545) foram confirmados e 32,8% destes (N = 834) evoluíram para o óbito. Além disso, foi avaliada uma possível relação entre o aumento expressivo do número de casos entre os meses de julho a novembro e ciclo dos vetores transmissores da doença (Figura 6). Para o Distrito Federal, o SINAN não registrou casos de FMB no período de 2007 – 2023. 

 

Figura 6. Casos notificados, confirmados e óbitos por febre maculosa segundo município de fonte de infecção. Brasil, 2007 a 2021. 

 

Tabela divulgada pelo Ministério da Saúde acerca dos casos confirmados de FM pelas regiões do Brasil: CasosFM_Brasil

Tabela divulgada pelo Ministério da Saúde acerca dos óbitos confirmados de FM pelas regiões do Brasil: ÓbitosFM_Brasil

 

Para mais informações acerca da FM, acesse o Boletim Epidemiológico, a partir da página onze, divulgado pelo Ministério da Saúde pelo link: Boletim Epidemiológico Vol. 53 – nº 23 — Ministério da Saúde (www.gov.br)

 

Febre maculosa em capivaras do Distrito Federal

A febre maculosa pode acometer não somente os seres humanos, como também as capivaras. Além da febre maculosa, as capivaras também podem ser acometidas por outras patologias com potencial zoonótico (transmissível de um animal ao homem), a exemplo da raiva, leptospirose, leishmaniose e tripanossomíase, assim como enterobacterioses e doenças fúngicas. As evidências dessas infecções nesses animais e o aumento das populações da espécie em áreas antropizadas são consideradas uma questão de saúde pública.

 

De acordo com o estudo intitulado de “Pesquisa de riquetsias em capivaras (Hydrochoerus hydrochaeris) de vida livre do Distrito Federal” as capivaras no DF não apresentaram riquetsemia (níveis circulantes da bactéria na corrente sanguínea), mas 96,3% das amostras apresentaram titulações de anticorpos para o gênero Rickettsia, sem alterações laboratoriais, indicando que já tiveram contato com bactérias do gênero. Além disso,  embora tenha encontrado uma infecção mínima (0,86%) nos carrapatos pela bacteria Rickettsia bellii e Rickettsia parkeri, bactérias não patogênicas, não encontrou nenhum sinal de endemia de FMB no DF já que não verificou a presença da bactéria Rickettsia rickettsii nas capivaras ou carrapatos do estudo.

 

O mesmo resultado foi compartilhado pela pesquisa “Identificação e monitoramento das populações de capivaras na orla do lago Paranoá” realizado pela Universidade de Católica de Brasília em parceria com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Proteção Animal do Distrito Federal – SEMA/DF entre os anos de 2021 e 2022.

 

Febre maculosa em cães do Distrito Federal

No trabalho intitulado “Pesquisa De Riquétsia do Grupo da Febre Maculosa em Cães no Distrito Federal, Brasil” foi possível observar a ocorrência da bactéria do gênero Rickettsia em cães recebidos na Gerência em Vigilância Ambiental de Zoonoses do Distrito Federal. Foram analisadas 197 amostras de coágulo de sangue de cães no ano de 2015. Os resultados encontrados foram negativos.

 

Os cães podem participar do ciclo de transmissão da febre maculosa por viverem em domicílio humano e por serem suscetíveis à doença, considerados animais sentinelas para febre maculosa. A doença tem sido descrita em seres humanos em vários estados brasileiros, no entanto, esse fenômeno não ocorre normalmente em populações de cães, mesmo sendo expostos aos vetores potenciais de Rickettsia rickettsii e outras rickettsias. Os primeiros registros positivos para riquétsias pertencente ao grupo da febre maculosa em cães no Distrito Federal – DF – foram realizados em 2013, em pesquisa conjunta com a Universidade de Brasília, Fundação Oswaldo Cruz e a Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal.

 

Controle de carrapatos de vida livre e medidas de prevenção

Medidas de controle da população de carrapatos de vida livre também podem ser adotadas na prevenção da febre maculosa. Considerando que a exposição direta a raios solares normalmente é fatal para os micuins (fase larval do carrapato-estrela), pode ser adotada a capina mecânica constante de áreas verdes com utilização humana, respeitadas as restrições ambientais de cada local, podendo-se usar a retirada manual ou aspiração dos restos da capina para aumentar a sua eficiência em reduzir os carrapatos presentes no ambiente.

 

É importante observar que o uso de carrapaticidas não é apropriado para o controle dos carrapatos, pois esses, além de apresentar baixa eficiência no controle do carrapato-estrela no ambiente, é nocivo a outros animais invertebrados e pode ser um contaminante da água e solo, podendo causar prejuízos ao meio ambiente. Os carrapaticidas podem ser aplicados em hospedeiros domésticos como os cães, equinos e bovinos, com a supervisão de um médico veterinário, como medida adicional de prevenção.

 

Da mesma forma, o uso de queimadas da vegetação no combate aos carrapatos, além de proibido (Lei nº 4.329/2009 e Instrução IBRAM nº 208/2013), traz mais prejuízos ao ambiente que os possíveis benefícios. Ademais, em se tratando do lago Paranoá, o Decreto nº 33.537/2012, que trata do zoneamento da APA do Lago Paranoá, proíbe os dois tipos de prática.

 

Decreto nº 33.537/2012

“Art. 4º Na APA do Lago Paranoá ficam proibidos:

(…)

IV. a prática de queimada, exceto para proteção da biota e mediante autorização do órgão ambiental competente;

(…)

VII. a utilização de agrotóxicos e outros biocidas;”

 

Além do controle da infestação de carrapatos, outras ações de prevenção e controle de possíveis zoonoses ligadas aos carrapatos podem ser tomadas como evitar contato com as áreas de risco (que são aquelas com presença de carrapatos, capivaras), realização de orientações sobre a busca pelos serviços de saúde na presença de sintomas, diagnóstico precoce e busca pela importância de antecedentes epidemiológicos. Dentre as recomendações constatadas sobre a prevenção, é importante destacar:

  • Usar roupas claras porque facilitam enxergar melhor os carrapatos;

  • Examinar o corpo cuidadosamente a cada três horas porque o carrapato transmite a bactéria responsável pela doença só depois de pelo menos quatro horas grudado na pele;

  • Colocar a barra das calças dentro das meias e calçar botas de cano mais alto nas áreas que possam estar infestadas por carrapatos;

  • Ter em consideração que os sintomas iniciais da febre maculosa são semelhantes aos de outras infecções e requerem assistência médica imediata; e

  • Quando for passear com seu pet em áreas com presença de carrapatos, não deixar seu pet fora da coleira, sob risco de levarem carrapatos infectados para a residência onde vive.

 

Referências bibliográficas

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CRUZ, L.M. 2016. Pesquisa De Riquétsia do Grupo da Febre Maculosa em Cães no Distrito Federal, Brasil. Dissertação de mestrado. Universidade de Brasília. 67p

IBAMA/MMA. Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Superintendência de Controle de Endemias do Estado de São Paulo. Ins1tuto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recuros Naturais Renováveis. Diretrizes de combate à febre maculosa, p. 1–8, 2008.

PREFEITURA DE CAMPINAS. Começa I Semana de Prevenção e Controle da Febre Maculosa, 2019. Disponível em: http://www.campinas.sp.gov.br/noticias-integra.php?id=36598 SECRETARIA da Saúde do Estado de São Paulo. Divisão de Zoonoses. Febre Maculosa. In:

QUADROS, A. P. N. 2020. Pesquisa de riquetsias em capivaras (Hydrochoerus hydrochaeris) de vida livre do Distrito Federal. Dissertação de mestrado. Universidade de Brasília. 49p

Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo, Coordenadoria de Controle de Doenças, Centro de Vigilância Epidemiológica. Guia de vigilância epidemiológica. São Paulo; 2012. p. 63-70.

SOUZA CE, Calic SB, Camargo MCGO. O papel das capivaras Hydrochaeris hydrochaeris na cadeia epidemiológica da febre maculosa brasileira. Rev Bras Parasitol Vet. 2004; 13 Supl 1:203-5

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